A eleição de 2018 entra para história do Brasil como um momento político de radicalidade: de ataques fortes entre candidatos e de ampliação da intolerância entre os eleitores. Um cenário no qual o debate dá vez à opinião formada, a plataforma política fica relegada ao segundo plano, dando lugar a ataques pessoais, quando cada lado avalia que tem razão.
A grande pergunta é por que chegamos neste grau de intolerância? E esta intolerância é momentânea?
Uma vertente teórica da Sociologia trabalha com a premissa de que o brasileiro é ‘cordial’ por natureza e na prática a população sempre foi muito resiliente as sucessivas dificuldades e turbulências políticas. Mas não podemos esquecer que a sociedade sofre com cada ação política permissiva que resulta da política brasileira. A retrospectiva dos telejornais dos últimos anos nos dariam a seguinte síntese:
1º) Ampliação gradativa das denúncias de corrupção e prisão de grandes políticos e empresários;
2º) Ampliação da insegurança pública, colocando o Brasil entre os países mais violentes do mundo;
3º) Ampliação da ineficiência de serviços públicos (como saúde, educação, infraestrutura, saneamento, etc);
4º) Ampliação das dificuldades econômicas da população (diminuição do poder de compra, ampliação do desemprego, etc).
Neste contexto, o primeiro fator de motivação à intolerância está associado à descrença, à indignação social. Em certo sentido, há um grande sentimento de revolta e o ser humano tende a “descontar em quem está mais próximo”, é mais fácil atacar o mensageiro, desqualificar quem defende o lado contrário. Todos querem um país melhor, mas nossa educação dicotômica sempre quer achar um culpado: certo X errado, justo X injusto, bem X mal.
É importante termos em mente que esta indignação social é ampliada pela atual conjuntura em quem vivemos. Um cenário onde a tecnologia ocupa cada vez mais tempo em nossas vidas, o nosso cotidiano está cada vez mais corrido e estamos cada vez mais ocupados. O resultado disso é menos paciência e mais individualismo. Estamos cada vez mais egoístas e nos envolvemos e nos preocupamos cada vez menos com o outro.
Então, temos a base social que fomenta a intolerância: indignação social + menor paciência + ampliação do individualismo.
Esta intolerância tende a se manter se não houver um movimento, uma consciência política sobre a realidade que temos e a realidade que deveríamos ter!
Primeiro, o Estado e os políticos devem atuar em prol do interesse público. Temos que resgatar o bem-comum que o sistema político e os políticos vêm deturpando ao longo da história (toda vez que trabalham pelos interesses das corporações ou pelos seus próprios interesses).
Segundo, a sociedade deve rever a sua cultura e o seu comportamento em relação ao jeitinho brasileiro, passando por quatro estágios: Consciência: desta realidade, saber que cada um tem um papel neste processo. O debate: sobre esta realidade. A educação: pensar na educação informal (que ocorre dentro de casa e na rede de relações) até a educação formal (de sala de aula). A prática: onde se ‘abre mão’ de vantagens pessoais em detrimento de valores e se pratica o que foi acordado, se trabalha em prol do bem comum.
Esta mudança comportamental tende a ampliar a confiança no outro, no governo e no funcionamento das instituições e estimular a participação, o empoderamento da população, diminuindo a intolerância.
https://www.coletiva.net/colunas/por-que-estamos-vendo-tanta-intolerancia,284211.jhtml
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO – Instituto Pesquisas de Opinião em 1996. Utilizando a ciência como vocação e formação, se tornou uma especialista em comportamento da sociedade. Socióloga (MTb 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na UFPel e tem especialização em Ciência Política pela mesma universidade. Mestre em Ciência Política pela UFRGS e professora universitária, Elis é diretora e Conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) www.asbpm.org.br