A máxima, “não há nada tão ruim, que não tenha algo de bom”, serve para motivar a nossa reflexão em relação aos ganhos, aos ensinamentos trazidos pela pandemia.
Começamos pensando na expansão da solidariedade: o medo e a preocupação estão fazendo o individualismo diminuir. Há muita gente ajudando ao próximo, percebe-se a cooperação se ampliando e o sentimento de comunidade começando a ressurgir.
Muitos caminhoneiros passaram a ser recebidos nas entradas de cidades, com marmitas, materiais de higiene ou cestas básicas. Alguns deles, trabalham com a premissa de não retornar para sua casa durante a pandemia. E os grupos de apoio, presentes nas estradas, motivam esses profissionais a continuarem sua jornada para manter o abastecimento das cidades.
Os movimentos espontâneos de ajuda aos trabalhadores informais e a população mais vulnerável se multiplicam e buscam suprir as famílias com alimentos, roupas e materiais de higiene.
Costureiras voluntárias fazem máscaras para distribuir ou trocar por alimentos, enquanto pessoas procuram em seus armários matéria-prima para colaborar com essa ação.
Universidades passam a trabalhar na produção de todos os insumos necessários para a área da saúde. Os cientistas do mundo inteiro estão alinhados em torno de pesquisas para a cura do vírus e o discurso mundial apregoa que a vacina chegue para todos, de forma igualitária.
Ampliamos nossa relação utilitária com a tecnologia. Pessoas que antes utilizavam os celulares somente para ligações e como passa tempo, hoje o utilizam para solicitar o auxílio emergencial, buscar informações e até mesmo para pagamentos ou compras online (mesmo que com a relutância dos mais velhos).
Os pequenos comércios (principalmente os de bairro) passaram a ser valorizados. Atendendo pela janela, entregando em casa ou até mesmo mantendo as suas portas abertas, vendem a um público que tem aderido ao isolamento.
A pandemia fez ressurgir os velhos ensinamentos de nossos pais: poupe! Tenha reservas de emergência, seja precavido. A maior parte das pessoas não trabalha com reservas financeiras e está aprendendo que a educação financeira é vital.
No campo dos sentimentos, ganhamos mais tempo para avaliarmos a nossa jornada de vida, hábitos de consumo e a relação com as pessoas que convivemos e amamos. Sem ter a possibilidade de consumir, muitas pessoas tiveram que resolver sua ansiedade ou angústia de outra forma. Quando temos que reavaliar conceitos, passamos a repensar o que realmente é importante e necessário para viver.
E a revisão de valores permite o resgate de: crenças (olhando para dentro de si), de nossa espiritualidade, de nossa história e de nossa identidade. E como ninguém sabe o dia de amanhã, o perdão vai ganhando mais espaço entre as pessoas e reaquecendo relações antes enfraquecidas.
A pandemia acaba sendo um gatilho, que propicia uma nova rotina e que pode resultar em novos hábitos. Isso não significa que o egoísmo, o oportunismo e o jeitinho brasileiro acabarão. Mas indica que a pandemia pode motivar a diminuição desses sentimentos perversos ampliados em uma sociedade que estava exacerbando seu individualismo.
Então, mesmo com todas as suas obscuridades, a pandemia pode trazer uma luz em um momento de tantas incertezas!
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Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO – Instituto Pesquisas de Opinião em 1996. Utilizando a ciência como vocação e formação, se tornou uma especialista em comportamento da sociedade. Socióloga (MTb 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na UFPel e tem especialização em Ciência Política pela mesma universidade. Mestre em Ciência Política pela UFRGS e professora universitária, Elis é diretora e Conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) www.asbpm.org.br