Política de Privacidade

IPO TÁ NA MÍDIA: Entrevista de Elis Radmann para a Revista Voto

Em entrevista exclusiva ao Grupo VOTO, a cientista social e política Elis Radmann fala sobre o momento de transformação social que estamos vivendo e de que maneira isso impacta nas narrativas de direita e esquerda. 

Na sua opinião, hoje existe censura digital no Brasil? E por quê?

Essa pergunta não pode ser respondida de forma dicotômica. Estamos passando por um processo de transformação cultural, social e política em um novo ambiente, o digital. As redes sociais criaram um canal direto entre os vários players da sociedade, favorecendo um empoderamento social. Esse empoderamento está motivando a ampliação do individualismo e do egoísmo. Cada um tem um “palco”, uma narrativa e uma verdade para expor. E esse “palco” está ambientado em um contexto de radicalização política, de polarização de ideias e de impaciência. Temos que ter clareza de que há muita coisa acontecendo. Saímos da zona de conforto, de um mundo em que, supostamente, se sabia “o que era certo e o que era errado”. E momentos ímpares geram decisões ímpares. Na percepção do senso comum vai estar a sensação e até a certeza de que há uma censura digital, enquanto os representantes das instituições estão tentando calibrar, regrar, rever as “cláusulas do contrato social”, “restabelecer a ordem”, deixar claro o que pode e o que não pode ser feito, estabelecer uma nova régua para determinar os limites da internet. Temos que definir quando o direito de um está ferindo o do outro. É como se estivéssemos consertando o avião em pleno voo, teremos muita turbulência pelo caminho.

Qual a tênue diferença entre liberdade de expressão e violência verbal contra o Estado de Direito e a democracia?

Liberdade de expressão não pode ser entendida pelo sentido literal do termo. Por princípio, a regra diz que tudo o que não pode ser manifestado de forma presencial, não pode ser postado. Temos que pensar no ordenamento jurídico e na sua adaptação ao mundo virtual. Se desacato à autoridade, desrespeito, injúria, difamação, assédio moral, racismo, preconceito, atentado contra a democracia e tantos outros estão tipificados como “crimes”, não podem ser temas defendidos como liberdade de expressão. O senso comum diz que o seu direito termina quando começa o do outro, e a constituição define que o limite da liberdade de expressão segue a mesma diretriz. A liberdade de expressão é barrada pelo princípio da dignidade da pessoa humana, que contempla o direito à vida privada, à imagem e à honra. O respeito, que é um elemento subjetivo, entra neste debate e exige tolerância à ideia oposta, ao pensamento diferente.

De certa forma, a “atual” liberdade de expressão pode questionar e criticar problemas, situações, decisões, mas não pode desqualificar ou atacar pessoas ou instituições. Temos liberdade de debater e redesenhar o estado democrático que temos e o que queremos ter, mas não podemos atacar o atual Estado Democrático de Direito, sob pena de atentar contra a Lei de Segurança Nacional. 

Alexandre de Moraes tem extrapolado os limites e se excedido no poder que lhe compete?

Retomo a frase anterior: momentos ímpares geram decisões ímpares. Se estamos vivendo um momento de transformação social, ficamos sem parâmetros objetivos. De um lado, temos a nossa Carta Magna que precisa ser preservada e Alexandre de Moraes ocupa o papel de porta-voz dessa defesa. De outro, temos a insatisfação de uma parte da sociedade com todas as permissividades da política e da justiça brasileira. Há um corporativismo que mantém o status quo vigente e que limita o desenvolvimento do país e, até mesmo, a igualdade social. Resolver esta equação não é fácil, é como se faltasse “luz no fim do túnel”. O desafio é manter as conquistas salutares e alterar o que não faz bem para o país, e só vamos fazer isso se fizermos as reformas estruturais necessárias (como uma administrativa, uma tributária e até mesmo uma eleitoral e política não casuística). Agora, como fazer isso com o Congresso legislando em causa própria? O caminho é o amadurecimento da sociedade e a busca por uma assembleia constituinte exclusiva, em que os parlamentares tenham a única incumbência de revisitar o texto Constitucional.

A política do Brasil, pelo excessivo amor ideológico, tem esquecido de debater gestão pública?

Sim, neste caso podemos pensar em uma resposta dicotômica. Na ciência política, a chamada “teoria da ferradura” apregoa que os extremos se aproximam. Vamos pensar na imagem de uma ferradura. Imagine a extrema-esquerda e a extrema-direita em pontas opostas, mas mais próximas entre si do que os demais espectros ideológicos. Como cada uma dessas ideologias extremistas quer defender a sua tese, preocupam-se mais com uma política de governo ou até mesmo de partido do que uma política de estado, e acabam não olhando para a evolução da gestão pública.

Sofrimento com shadowban: hoje a direita brasileira está com medo diante de demissões e perseguições?

A transformação social e política em curso, influenciada pelo desenvolvimento progressivo das redes sociais, criou novos fenômenos como “palco” para o discurso do ódio, o espaço de atuação dos haters e a cultura do cancelamento. A mudança na esfera do poder central alterou a posição dos jogadores, mas não manteve a polarização ativa. A tendência é que os que antes eram perseguidos, agora se tornem perseguidores. E os que antes perseguiam, agora se tornem perseguidos. Em suma, com o radicalismo político atual, os controles do algoritmo serão cada vez mais utilizados para coibir a narrativa e a ação dos extremistas, sejam de esquerda ou de direita.

Leia a também em:
https://www.revistavoto.com.br/afinal-ha-ou-nao-censura-digital-no-brasil/

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: Olá Leitor. Nosso material está protegido pela legislação brasileira sobre direitos autorais.