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Individualismo, intolerância e redes sociais

No último artigo, apresentei uma reflexão entre a negação da política e a intolerância, demonstrando que “uma coisa leva à outra”. Parte da população migrou do estágio de ceticismo ao nível da negação da política. E essa negação atinge os políticos, perpassa a confiança nas instituições e se manifesta contra o politicamente correto.

A negação se estabelece com base no sofrimento, nas dores de uma grande parcela da sociedade. Eminentemente, essa negação está associada à ineficiência ou omissão do Estado (em todos os níveis da federação) e à super-representação dos direitos das minorias em detrimento ao direito da maioria.

Nas últimas décadas, as deliberações legislativas, o ordenamento jurídico e as políticas públicas procuraram se basear no princípio constitucional para atender as dívidas históricas com as minorias.

Ocorre que o atendimento do direito das minorias de forma desequilibrada pode fragilizar o sentimento de proteção social. A premissa diz que o direito da minoria não pode se sobrepor ao direito da maioria, sob pena de se pôr em risco o conceito de maioria.

Mas esse contexto tem outras variáveis que fomentam a “tempestade perfeita”. Vamos colocar nesse debate mais dois elementos: as redes sociais e a ampliação do individualismo.

Imagine quem se sente abandonado pelo Estado, tanto pela ineficiência dos serviços quanto pela percepção de estar apartado de direitos específicos. Pense em um indivíduo empoderado pelas redes sociais, acreditando que pode dizer o que bem entende em sua timeline.

Nesse contexto, a “tempestade perfeita” em termos de intolerância teve sua origem na cultura política brasileira, se intensificou diante da prática política dos gestores públicos e está sendo fomentada pelas condições conjunturais e estruturais da realidade tecnológica que vivemos.

Volto a repetir, uma coisa leva à outra! São vários fenômenos ocorrendo simultaneamente e influenciando o comportamento da sociedade. E o pior é que essa intolerância, que mostra sua face mais crítica nos debates políticos, está se constituindo em outras relações sociais, se manifestando em diferentes campos da realidade: dentro das escolas, nas relações de trabalho, no trânsito e dentro das famílias.

Compreender o contexto em que vivemos é o caminho para estabelecermos metas de futuro. E o primeiro passo para se estabelecer o diálogo com alguém que está indignado com a realidade é ouvir, se conectar com a sua dor, olhar o mundo a partir do seu ponto de vista.

Estabelecida a conexão pela empatia, o segundo passo é buscar elementos comuns de concordância, aquilo que ambos concordam. Para só depois debater as divergências. O debate das divergências precisa ocorrer dentro de uma lógica de negociação, onde se avalia o grau de cedência de ambas as partes.

Estabelecendo o regramento para o diálogo, se constrói a lista de expectativas. Se retoma a capacidade de sonhar, de ter esperança. Entretanto, não podemos esquecer que a crença precisa estar alinhada com um propósito, com uma bandeira, com a capacidade de projetar objetivos.

Mas para diminuir a tendência do individualismo exacerbado e o crescimento da incoerência, se faz necessário o resgate de valores, do sentimento de comunidade, dos elos de identidade, de ações de integração. A intolerância é uma doença social que precisa de tratamento e o tratamento perpassa a solidariedade e o restabelecimento dos princípios morais e éticos.

http://www.coletiva.net/colunas/individualismo-intolerancia-e-redes-sociais,318073.jhtml

Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO – Instituto Pesquisas de Opinião em 1996. Utilizando a ciência como vocação e formação, se tornou uma especialista em comportamento da sociedade. Socióloga (MTb 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na UFPel e tem especialização em Ciência Política pela mesma universidade. Mestre em Ciência Política pela UFRGS e professora universitária, Elis é diretora e Conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) www.asbpm.org.br

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